Por Daniel Rocha

Em 02 de maio de 1996, a extinta TV Manchete ganhou uma afiliada local na cidade de Teixeira de Freitas, BA, a TV Sul Bahia. Em 17 de setembro do mesmo ano estreou no canal “Xica da Silva’‘, primeira novela da TV brasileira protagonizada por uma mulher negra. Segundo relatos de uma telespectadora da época, a novela não passou despercebida entre os teixeirenses.   

Naquele ano de 1996, apesar da crise financeira que mais tarde levaria à falência, a TV Manchete vivia uma boa fase, programas jornalísticos, séries e desenhos japoneses, Cavaleiros do Zodíaco, conquistou boa audiência e repercussão. Momento em que a TV regional, Tv Sul Bahia, também alcançava uma boa atenção com o seu jornalístico, “Sul Bahia Notícias,” que apesar do pouco tempo no ar já interagia bem com a comunidade.  

Em junho de 1997, por exemplo, o jornalístico da emissora foi acionado por pais dos alunos da escola Anísio Teixeira, improvisada no antigo barracão do antigo Clube AABB, no bairro Recanto do Lago, para denunciar o calor que estava exposto os alunos devido à falta de ventilação no lugar e as péssimas condições da escola. 

Cenário que mudou com a estreia da novela Xica da Silva, que tão logo se tornou o principal sucesso de audiência e crítica do canal. A obra que mistura fatos históricos com fictícios, traz Taís Araújo no papel da histórica “Chica da Silva”, empoderada mulher negra escravizada que conquistou seu espaço no século XVIII, durante o ciclo do ouro nas Minas Gerais, ao casar com um representante do rei de Portugal.  

Em 2020, o colunista Jeff Benício, da Sala de TV do portal Terra, fez lembrar que a novela tinha texto politicamente incorreto e abordou o racismo no contexto histórico do Brasil com cenas explícitas de assédio moral e violência física.

Toda essa ousadia e evidência foram percebida pelos telespectadores e telespectadoras da novela na cidade. De acordo com o relato da moradora Luciane Souza (38 anos), mulher negra, a novela que era discriminada por alguns de alguma forma alterou algumas opiniões e perspectivas.  

“Não só pelo que era visto na televisão, mas pela repercussão em si.  Taís Araújo era capa das revistas e a beleza negra ganhou destaque. Todo mundo queria imitar seus jargões, balanço, jeito e postura. Mas a novela não era assim bem vista, era muito criticada e recriminada porque, alegavam, era uma novela para adultos (…), mas a gente assistia assim mesmo escondida dos pais”.  

Em agosto de 1997, a novela chegou ao fim depois de 231 capítulos de bons retornos para a TV Manchete. Suponho que, embora fosse vista com ressalvas por alguns na cidade, a mesma também aguçou a percepção do público para algumas questões relativas ao papel da mulher negra e padrões de beleza da sociedade que tinha a TV como uma das principais fontes de informação e construção de perspectiva em relação às tendências e comportamentos. 

Contudo, lembra o historiador Jéfferson Balbino, “é preciso a todo tempo repensar a maneira que a mídia representa o processo de construção de identidades em nossa sociedade.  Apesar de que Xica da Silva tenha o mérito de propiciar à mulher negra o devido protagonismo que, aliás, lhe é de direito, não colaborou para um avanço social, pois optou por renunciar uma discussão mais séria em torno da identidade negra brasileira.”

 Segundo Wikipédia, um ano depois de ser afiliada à Manchete, a TV Sul Bahia, na época ligada a Rede Sul Bahia de Comunicação, passou ser afiliada do SBT, quando a antiga rede que a retransmitia, estava com sinais de crise na audiência, o que levou afiliadas deixarem a Manchete por outras redes, que foi umas das causas da sua falência em 1999.

Fontes:

BALBINO. Jéfferson. O protagonismo da mulher negra na teledramaturgia Brasileira no final do século XX: Uma análise da telenovela “Xica da Silva.” 

Daniel Rocha*

Historiador graduado e Pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.  Contato WhatsApp: (73) 99811-8769 e-mail: samuithi@hotmail.com 

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