Por Daniel Rocha
No início do século XX, quando o território que hoje conhecemos como Teixeira de Freitas ainda era um pedaço esquecido do extremo sul da Bahia, subordinado à cidade de Alcobaça, o rio Itanhém era mais do que um curso d’água. Era uma veia pulsante, o coração que bombeava vida, economia e históri
Suas águas, que nascia em Minas Gerais e corre até o mar em Alcobaça, eram o palco de uma dinâmica intensa, onde os canoeiros eram protagonistas invisíveis de um enredo que misturava trabalho, aventura e sobrevivência.

Entre eles, um nome ecoava com força: Braço Forte. Um homem que, como o rio, era feito de águas turbulentas e correntezas imprevisíveis. Obstinado, cheio de qualidades e falhas, ele vencia pedras e cachoeiras, mas carregou consigo uma história manchada por um trágico episódio que nunca se apagou da memória de dois dos antigos moradores.

O rio Itanhém, cujo nome de origem Pataxó significa “Rio de Pedras”, não era um caminho fácil. Ao longo de seu percurso, cachoeiras e corredeiras impunham limites à navegação. A Cachoeira do Guerreiro, por exemplo, era o ponto onde muitos canoeiros paravam, resignados.

Além dela, segundo informou o memorialista Domingos Cajueiro Correia, outras quedas d’água, como a Cachoeira do Funil, a do Bendegó, a da Conceição e a Quarta Cachoeira, próxima à Fazenda Nova América , desafiavam até os mais experientes. Essas barreiras naturais tornavam praticamente impossível um percurso completo até a divisa com Minas Gerais.

O príncipe Maximiliano de Wied-Neuwied, por exemplo, que navegou pelo rio em 1818, registrou em seus escritos o quanto essas barreiras eram intransponíveis. Sua expedição parou na Fazenda Morro das Araras, hoje comunidade Arara, sem conseguir avançar.

Mas essas barreiras não intimidou a todos. Quase um século depois um homem comum, um aventureiro de braços fortes e coragem de sobra, conseguiu o que parecia impossível: desbravar o rio Itanhém em toda a sua extensão. Seu nome? Braço Forte.


Segundo Isidro Alves do Nascimento, em memória, um antigo morador da região, conforme ouviu dizer, Braço Forte era um canoeiro autônomo que vivia da extração de madeiras nobres e da venda de “óleo de pau”, um produto valioso extraído de árvores como a copaíba, usado como remédio fitoterápico, das florestas virgens da região.

Segundo o causo popular, sua determinação em buscar o óleo raro o levava a enfrentar as cachoeiras e a mata fechada de uma forma que parecia quase sobre-humana. “Quando ele chegava nas cachoeiras, simplesmente saía do rio, abria uma trilha pela mata, enfrentando cobras e espinhos, contornando o percurso pedregoso para voltar para a água”, contou Isidro em 2014, em uma conversa informal.

Mas o causo de Braço Forte não exalta apenas os seus feitos. Jair Nascimento de Freitas , antigo morador da Fazenda Nova América, lembra-se de ter ouvido, quando criança, um causo que manchou a fama do lendário canoeiro. Braço Forte, conhecido por sua habilidade no remo e pela extração de óleos raros, também foi protagonista de um trágico episódio que envolveu vingança, traição e um crime chocante.

Essa parte do causo, que será detalhada no relato, revela um lado sombrio de Braço Forte, que o transformou em uma figura ao mesmo tempo lendária e super controversa. Fatos que refletem as complexas relações humanas que moldaram o território teixeirense ao longo do rio Itanhém na primeira metade do século XX.
Braço Forte não é apenas um herói ou um vilão. Ele é um retrato da humanidade em suas nuances mais profundas: força e fraqueza, glória e tragédia, aventura e dor. Sua história, como as águas do rio que ele desbravou, segue fluindo, viva na memória daqueles que ainda guardam suas lembranças.
Na próxima crônica, mergulharemos nas águas turbulentas desse episódio trágico, que transformou Braço Forte em uma lenda que não se apaga. Acompanhe.

Daniel Rocha da Silva

Historiador graduado e pós-graduado em História, Cultura e Sociedade pela UNEB-X.

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