Por Daniel Rocha*
No romance Tieta do Agreste (1977), de Jorge Amado, o narrador observa que “os nomes dados por autoridades, escritos em placas de metal confeccionadas em oficinas especializadas na cidade, não resistem às placas de madeira feitas por mãos artesanais e anônimas. Mão do povo”.
Parece que algo semelhante ocorreu em Teixeira de Freitas, BA, onde as denominações oficiais foram, ao longo da história, substituídas por nomes populares criados pelo próprio povo. Conforme o IBGE, em 14 de fevereiro de 1957, o povoado de São José do Rio Itanhém foi renomeado para Teixeira de Freitas em homenagem ao ilustre baiano, pai da estatística brasileira, através do Ofício nº 91.
Esse documento oficial é um dos poucos que confirmam que o povoado teve outra denominação antes de sua mudança para Teixeira de Freitas. José Esteves Ribeiro Neto destaca que, em 1957, o chefe da agência de estatística de Alcobaça solicitou oficialmente à prefeitura e à câmara municipal uma homenagem ao imortal baiano, o que foi bem aceito pelo prefeito da época.
O batismo oficial, no entanto, não impediu que a cidade recebesse alcunhas e apelidos atribuídos pelos populares, como evidenciam os relatos de antigos moradores descritos em documentos e publicações a seguir.
Miguel Geraldo Farias Pires, em uma compilação histórica de 1986 publicada na edição especial do jornal Alerta em maio de 2013, relata que “devido à bifurcação das estradas de rodagem de Alcobaça e Água Fria (hoje Medeiros Neto) e do povoado de São José do Itanhém até o porto de Santa Luzia, o povoado era conhecido como Perna Aberta”.
Em entrevista à revista Origens, em 1985, o senhor Servídio do Nascimento (in memória) recordou que o município foi, por muito tempo, chamado de “Arripiado”, nome dado em virtude das frequentes discussões e bate-bocas no pequeno comércio.
Ele também lembra que o primeiro comerciante do povoado, Chico D’água, ao construir uma barraca para atender os motoristas que passavam pela estrada de Eleosippio Cunha, plantou uma vasta roça de mandioca onde hoje está o centro da cidade, o que levou a lugar a ser apelidado de Mandiocal pelos madeireiros e transeuntes.
No trabalho monográfico A vida privada dos negros pioneiros no povoamento de Teixeira de Freitas, na década de 1960, Susana Ferreira evidencia que o povoado foi conhecido como o “Comércio dos Pretos”:
“Tão logo foi aberto o caminho de terra pela empresa mineira Elecunha, mudaram-se para o lugar, chamado na época de Mandiocal, os negros Francisco Silva e Manoel de Etelvina – este abriria um boteco, tornando-se o comerciante pioneiro. Assim começava o ‘comércio’, mais tarde denominado ‘Comércio dos Pretos'”.
Isael de Freitas Correa (em memória) recordou, em entrevista em 2009, que o povoado mudou de “Ripiado”, Arrepiado, para Tira-Banha, após um incidente em que Manoel de Etelvina, comerciante pioneiro, levou uma facada. A lenda diz que a facada “tirou a banha” do comerciante.
Como Teixeira cresceu na divisa dos municípios de Alcobaça e Caravelas, é importante mencionar a parte caravelense do povoado, a Vila Vargas, que surgiu com a exploração de madeira ao sul das primeiras estradas de rodagem, atualmente conhecida como Avenida Marechal Castelo Branco.
Benedito Ralile revela que “a formação do povoado ocorreu na era Vargas (década de 1950), recebendo esta homenagem ao presidente Getúlio Vargas”.
É fundamental ressaltar que os nomes oficiais não são escolhidos pelos moradores, enquanto as denominações populares têm um significado que informa e caracteriza o lugar de acordo com sua identidade e cultura. As denominações oficiais, por sua vez, servem apenas para homenagear figuras importantes da história do país e do estado.
Ao renomear o povoado para Teixeira de Freitas, as autoridades removeram um nome que tinha uma conexão significativa com a história e a cultura local, como evidenciam os apelidos Comércio dos Pretos, Mandiocal e São José do Rio Itanhém.
Ainda hoje, ouve-se referências a toponímicos como Teixeira das Tretas, Texas City e Praça dos Leões (oficialmente Castro Alves), e o Bairro Wilson Brito, conhecido popularmente como Buraquinho. Todos nomes ditos e escritos pela mão do povo.
Referências:
RALILLE, Benedito Pereira; SOUZA, Carlos Benedito de; SOUZA, Scheila Franca de. Relatos históricos de Caravelas: (desde o século XVI). Caravelas, BA: Fundação Professor Benedito Ralille, 2006.
JORNAL ALERTA. Teixeira de Freitas: (Gráfica Jornal Alerta, Ano XII N° 779ª, maio, 2007). Edição especial de aniversário de 22 anos de Teixeira de Freitas.
BANCO DO NORDESTE, As origens. Teixeira de Freitas, Fortaleza – Ceará. P.05-07, Janeiro 1986.
FERREIRA, Susana. A vida privada de negros pioneiros no povoamento de Teixeira de Freitas na década de 1960. Uneb campus-x. Teixeira de Freitas, BA, 2010.
IBGE (Acesso em: 05 de agosto de 2013).
Foto: Lateral da prefeitura municipal, 1985. Jornal Alerta, 2013.
[…] Fonte: http://www.tirabanha.com.br […]
Miguel Geraldo Farias Pires, meu avô, que Deus o tenha em um bom lugar, esse que deu o nome da cidade de Teixeira de Freitas.